10 de outubro de 2009

A Alquimia musical-literária de Raul Seixas


Raul Seixas, o Raulzito, é daqueles fenômenos raros como o cometa Halley, que só acontecem de tempos em tempos e ainda assim deixam suas marcas de forma duradoura por longo tempo. Raul foi mais do que se costuma pensar, um cantor e compositor brasileiro com letras criativas acrescidas de uma postura e visual extravagante para sua época. Ele foi um grande pensador que conseguiu fazer uma reflexão irreverente sobre nossa identidade nacional e, ao mesmo tempo, conduzir-nos a meditação sobre os grandes problemas que intrigam todo ser humano.
Raul dos Santos Seixas (Bahia, 1945-1989) desde cedo demonstrou ser uma pessoa curiosa e irreverente. Sua paixão pela leitura e pela escrita deu como resultado uma obra musical ímpar que une de forma primorosa uma poesia incrível e ao mesmo tempo uma profundidade filosófica rica de metáforas e alegorias. Entre as grandes influências que podemos perceber na obra de Raul podemos citar: os grandes poetas brasileiros, entre eles o poeta paraibano Augusto dos Anjos, a Filosofia em geral, em especial do filósofo Nietzsche (1844-1900) e do o anarquista francês Joseph Proudhon, o pensador e mago inglês Aleister Crowley (escritor do Liber Oz ou O livro da Lei, Crowley era admirado pelo poeta português Fernando Pessoa, e cognominado a ‘Besta do Apocalipse’), os grandes livros da humanidade, tais como a Bíblia, o Tao Te King, o Alcorão e o Baghavad Gita (do épico hindu Mahabharata). A paixão de Raul Seixas pela literatura e sua vontade de escrever foram obscurecidas pelo seu talento musical, o qual segundo ele era apenas um veículo ou uma desculpa para revelar suas idéias. A obra musical de Raul Seixas pode ser comparada a uma enciclopédia de conhecimentos sobre a vida, onde cada música traz uma ou mais temáticas que dão o que pensar, com temas que vão desde o amor, a morte, a loucura, a utopia de uma nova sociedade, em suma, a cultura de sua época transformada em poesia filosófica.
Raul é o resultado alquímico de tudo que ele assimilou em termos de cultura popular, cultura erudita e contracultura. Ele é um dos baby boomers, ou seja, os bebês nascidos na era da bomba nuclear, aqueles que viveram numa época de transformações profundas nos costumes, na sociedade, na economia, no amor, etc. Ele viveu intensamente as décadas de 50 (época do surgimento do rock n roll, a expressão mais radical da revolução jovem), 60 (época do surgimento da guerra fria e das mudanças tecnológicas, além da revolta contracultural, dos hippies e do maio de 68), 70 (época da guerra do Vietnã, da discoteca, dos punks e do auge da Ditadura Militar no Brasil) e, por fim, da década de 80 (segundo ele mesmo, uma “charrete que perdeu o condutor”), uma década de ilusões perdidas, do fim da Ditadura Militar, da queda do muro de Berlim, do fim das ideologias e das utopias e da URSS.
Diante de tudo isso, podemos compreender que a obra de Raul Seixas tem múltiplas facetas e revela o alcance de suas idéias, que em geral se encontram muito à frente de sua época. Podemos dizer, sem sombra de dúvida, que nenhum outro compositor-cantor brasileiro chegou a tal nível de reflexão, não apenas sobre si mesmo, mas em relação ao seu próprio país e ao ser humano em geral. Sua obra é autenticamente brasileira, mas nem por isso deixa de levantar questões universais.
Que me perdoe o mago e escritor Paulo Coelho, mas Raul Seixas é verdadeiramente nosso mais autêntico alquimista, no qual poucos conseguiram encontrar a pedra filosofal!

Nenhum comentário:

Postar um comentário