15 de outubro de 2009

Histórias do “Reino de Maracangalha”

Há muito tempo atrás, num “Reino” muito, muito distante...
Tudo estava aparentemente tranqüilo, mas novamente aproximam-se as eleições no Reino de Maracangalha, um reino pobre e rico ao mesmo tempo, onde vive um povo inocente, puro e besta, pra não dizer tolo e trouxa. Existem dois impérios que rivalizam entre si este reino, são eles o Império de Rouberto Pescoço e Julius Kaifás, logo que Julius perdeu o reino na batalha de 2004 passou então a fazer reuniões escondidas com os lideres de rebanho, os puxa-sacos-mores, e entre eles o famoso Duque Ribabão, um clone medíocre de Tassus (Tassus também era conhecido como Tassanás, imagem e semelhança do Cão), o arquipoderoso imperador dos imperadores, mais conhecido como “galeguim-do-zói-azul”.
Desta vez Rouberto Pescoço tem em seu exercito o ‘vice-faz-nada’ Firmoleza, um ex-escrotófilo de Julius Kaifás, uma espécie de preguiçomem que durante anus (sim, anus!), o serviu reunindo a maior quantidade de desocupados do reino. Firmoleza tem agora o dever de se tornar o mais poderoso DE-PUTA-DO do reino para assegurar o poder de manipular os bobos e babões das redondezas. Firmoleza tinha uma doença muito rara, ele era ‘Celulouco’, ou seja, não conseguia passar muito tempo sem ligar ou receber chamadas no Celular, às vezes passava horas com o Celular no ouvido falando asneiras, ninguém conseguia falar com ele.
Felizmente a colônia de Parisjuçara onde dominava o bebum Dionisos, o bêbado, conseguiu se livrar de um mandatário de Rouberto Pescoço, o famoso Castelus de Areia, um falador e mentiroso que não possui cargo nem patente, mas apenas um salário de 10 mil roubelezas, a moeda do reino. Parisjuçara é uma colônia de exploração que foi sugada durante anos a fio por Dionisos, o bêbado, e depois por Castelus de Areia, que com ajuda de Rouberto construiu vários “falsos-edifícios-para-se-fazer nada” que eram reformados antes de serem construídos, nestas reformas eram gastos milhões de roubelezas que iam para os bolsos do imperador e seus sequazes. A principal empresa que fazia tais prédios era uma tal CR, ou seja, ‘Castelus-Rouberto’, e sempre cobrava mais que o que era gasto.
Mais uma vez haverá uma batalha entre Julius K. e Firmoleza desta vez pelo cargo de DE-PUTA-DO na grande eleição em que o povo tolo, puro e besta escolhe seu dominador através de um voto que é trocado por qualquer mixaria, como por exemplo uma camisa, um boné, uma conta de luz paga, 10 a 5 roubelezas ou outra mixaria qualquer. E o povo de Maracangalha se julga o povo mais feliz do mundo, muito embora seja o mais BURRO, FEIO, DOENTE e TROUXA de todos os povos do universo conhecido.
Junto com seus comparsas e o apoio de CIDA, a terrível (um abominável bi-trans-metro-sexual poderoso), como comandante da trupe, e com a ajuda de Rouberto, Firmoleza poderá manter seu poder sobre o povo basbaca de Maracangalha. E agora? Quem poderá nos defender? O que fazer?


14 de outubro de 2009

A história do filósofo Diógenes, o Cínico.


Autores: Francisco Bento e Rouxinol do Rinaré

Deus quando criou o homem
Facultou-lhe liberdade
Pra pensar e investigar
Deixou bem à vontade
Do amor a sabedoria
Nasceu a Filosofia
Como busca da verdade

Do grego, Filos, amigo.
Sabedoria é Sofia
A mãe de toda ciência
Da mente que tudo cria
Deus Pai, Primeiro Motor.
Poeta superior
Da divina poesia

Para alguém ser um filósofo
É preciso ter vontade
Ser um bom perguntador
E amante da verdade
Ser um homem curioso
Não viver só para o gozo
Porém ter sagacidade

Vou-lhe contar uma historia
De um filosofo engraçado
Por uns ele era mal visto
Por outros, admirado;
Conhecido como o Cão
Viveu sem esnobação
Em um barril enfiado

Quatro séculos a.C.
Toda a Grécia percorreu
Da escola do cinismo
Que no idioma Egeu
Significa o cão
Pois viveu na contra mão
E a muita gente mordeu

Falar de filosofia
Era sua profissão
E não dispensava crítica
Mostrando a contradição
Se o erro era gritante
Seu argumento triunfante
Finalizava a questão

Lá na Praça de Atenas
Ele era sempre encontrado
Com um cajado na mão
E um alforje do lado
Vivendo a duras penas
Mas o povo de Atenas
Lhe deixava indignado

Diógenes gostava muito
De aos outros criticar
Enxergava o erro alheio
E logo ia revelar
Com uma lanterna, de dia
A terra ele percorria
Para um ‘homem’ encontrar

Com sarcasmo e ironia
Expunha seu pensamento
Dizendo (constantemente):
“Na vida, a todo momento
Precisamos da razão
Ou de uma corda a mão
Para o próprio enforcamento”

Alguém querendo testá-lo
Em sua Filosofia
Pergunta-lhe: Quando devo
Almoçar durante o dia?
- Se rico, quando quiseres
Se pobre, quando puderes
Disse com sabedoria

Certa feita nosso herói
Toma seu banho solar
Chega Alexandre e pergunta:
- O que eu posso te dar?
- O que não é teu somente
Saindo da minha frente
Deixe o sol me iluminar!

Conta-se, pois, que Diógenes
Numa certa ocasião
Pede esmola a uma estátua
E alguém lhe pergunta a razão
Ele, sem titubear:
“É para me habituar
Com isso, a pedir em vão”

Sócrates foi seu modelo
(similar postura assume)
Na virtude, na palavra.
Filósofo de renome
Sendo ele bem mais louco
Pois viveu grande sufoco
Chegando até passar fome

Fora preso como escravo
E a um senhor vendido
Quando lhe foi perguntado
Para que era instruído
Disse ele: “Sei comandar”!
Continuando a falar
Esse filósofo atrevido

Um dia quando Platão
Suas aulas proferia
Falando então que o homem
Bípede implume seria
Diógenes, pra chateá-lo
Despena e joga-lhe um galo
Na cara, com ironia!...

Quis, pois, mostrar que o Filósofo.
Não tinha tanta razão
Despenando o galo todo
(Causou estupefação)
Soltou no meio do povo
Dizendo, num gesto novo:
“Eis o homem de Platão”!

Alguém pergunta a Platão
De uma forma inteligente:
“Que homem Diógenes é?”
Respondeu Platão somente
(Com ar de sabedoria
Fuzilou sua ironia):
“É um Sócrates demente”!

Diógenes em plena praça
Num constante vai-e-vem
Se masturbando tranqüilo
Falou encarando alguém:
“Quem dera funcionasse
Se ao meu estomago esfregasse
Passasse a fome também”!

Viu Diógenes certo dia,
Um jovem de tenra idade
Co’a mão em forma de concha
Bebendo água a vontade
Jogou fora o copo seu
Disse: “Um menino me deu
Lição de simplicidade”.

Muitos tratavam Diógenes
Como um ente vagabundo
No entanto o Cínico foi
Homem de saber profundo
Alguém perguntando um dia
A que pátria pertencia
Diz: “Sou cidadão do mundo”!

O que há mais miserável
Perguntam-lhe com pilhéria
Ao que responde Diógenes
Com a voz pausada e séria:
“Mais miserável na vida
É um velho na miséria”

Sem recursos, sem apego,
O cínico era acostumado
Viver sem luxo na vida
Porém, despreocupado,
Vivia a Filosofia
Da forma que bem queria
Da riqueza despojado

Rolava sobre a areia
Quente, durante o verão
E abraçava-se à neve
Na mais gelada estação
Dizia se preparar
Para poder enfrentar
A dura vida de cão

Talvez por fidelidade
A Filosofia, então,
Foi esse mais um motivo
Porque lhe chamavam Cão
Viveu como lhe convinha
Entre outras virtudes tinha
Poder de persuasão

Vivia ele sem lar
Exilado de sua terra
Não tinha aonde ir
Feito cão doido que erra
Parecia um vagabundo
Só, vagando pelo mundo
O seu destino encerra

Na Grécia, onde viveu
(que já parece esquecida)
Hoje virou um museu
Pois não tem a mesma vida
Por estranhos saqueada
Pelos “States” roubada
Ficou hoje emprobecida!


Prendendo a respiração
O grande cínico morreu
Uns dizem que foi um polvo
Cru, que Diógenes comeu,
A mais irônica versão
Nos conta que foi um cão
Que ao Filósofo mordeu.

Morreu Diógenes com cerca
De noventa anos de idade
Foi para junto de Zeus
Viver na eternidade
Por coincidência, ou não,
Seu nome tem relação
Com essa divindade...

‘Diógenes’ pois se traduz
Assim: “Nascido de Zeus”
O Cão volta a sua origem
Segundo os estudos meus
Viveu sem nenhum apego
Mais foi para o povo grego
Célebre pelos ditos seus!



Pajuçara - Março de 2004.

11 de outubro de 2009

Ele está no meio de nós!




Fim de ano é uma época engraçada,
as pessoas sentem cada vez mais o peso do trabalho,
tudo fica mais rápido, frenético, dinâmico, todos têm uma pressa inexplicável,
as casas são pintadas, as luzes são acesas,
os amigos sentem a necessidade de se rever,
as famílias buscam se aproximar,
os trabalhadores estão ansiosos pelas férias,
os alunos querem passar, os professores querem entrar em recesso,
Enfim, tudo indica que estamos aguardando algo diferente, algo novo, uma mudança.

A vida é assim, regida por ciclos, por etapas,
mesmo que nós não queiramos tudo passa por momentos que vão e vem,
as coisas se repetem, embora não da mesma forma, mas com um jeito de novo.
Mesmo sabendo que nada vai mudar substancialmente, nós acreditamos, esperamos, sentimos que há algo novo no ar, nossa consciência precisa acreditar para suportar a vida, para lhe dar sentido, para irmos adiante.
Em geral, os momentos de crise, de angústia pelo novo, são os mais promissores às mudanças, é através das crises que somos desafiados a inventar saídas, respostas, caminhos, estratégias.
O período de fim de ano é por si só um momento de crise, não como uma crise econômica, um cataclismo, mas é um momento de crise e ansiedade psicológica,
parece com o que denominamos 'apocalipse' (em grego, revelação), ou seja, é um momento de manifestação de anseios, de angústias, de esperanças, de alegrias, etc.

É sobretudo um momento propício para reflexão,
para parar, para pensar,
para parar e pensar,
reavaliar, planejar,
reestruturar, retomar ideais, projetos,
recriar sonhos.

O fim de um ano coincide com o inicio de um outro ano, de um novo período, de uma etapa nova, não que o seja realmente, porque tudo faz parte de uma convenção de nossa sociedade, o calendário, o qual varia de cultura para cultura, com datas, festas, feriados, dias santos, etc, isto não é senão uma criação coletiva tornada norma para todos. E muitas vezes vira uma gaiola onde ficamos presos. Mas há algo mais em tudo isso, sabemos que por trás das convenções existe um quê de diferente no ar, uma sensação de que devemos fazer algo, antes que o tempo se esgote, antes que passe o ano, devemos acelerar nossos projetos, criar saídas para realizá-los. Tudo isso faz parte dessa areia movediça que é o tempo, mas existe algo mais que não foge de nossas mãos assim tão fácil, existe um consolo para a fluidez continua do passar das horas...
Celebramos uma festa a cada ano que se repete, mas que mesmo sendo repetida é sempre novidade, é sempre ansiosamente aguardada...

É o Natal!
Natal, natividade, nascimento, eis o momento mais sublime da história humana! É Deus que arma sua tenda entre nós (como diz São João)!
É Deus que foge das alturas para estar conosco, para sofrer conosco, para chorar conosco toda nossa miséria desamparada!
É Deus pobre, no meio dos camponeses, dos pastores, dos animais, dos homens!
É Deus fugitivo, perseguido, procurado pelos poderosos para ser morto!
É Deus indefeso, sem armas, frágil!
É Deus menino, infantil, incapaz de lutar, de enfrentar o mal!
Mas é Deus Conosco, Emanuel, que mesmo sendo majestade, todo-poderoso, assume a condição de servo, de humilde, de manso, de fraco, de pobre, de humano...
Enfim, é o único capaz de nos salvar, pois é igual a nós, nos conhece como somos, em nossas fraquezas, pois sofreu nossas desventuras, e assim pode nos perdoar e nos redimir...

Celebremos esta festa que não se acaba, que não se compra, que não se consome, que não está nas tevês nem na mídia, que não precisa de árvore de Natal cheia de luzes artificiais, nem de guloseimas caríssimas, uma festa cuja luz é própria, pois vem do próprio Senhor, cuja árvore é a árvore da vida, cujo alimento se dá na comunhão...
Uma festa tão simples e que está ao nosso alcance na partilha com o irmão, com o pobre, com o que sofre...
Celebremos a noite feliz e eterna da salvação!
Feliz Natal!
Próspero Ano Novo!

O Deus Menino



Estamos nos aproximando de mais um Natal! É, para além do esbanjamento e do consumismo dos ricos, uma festa religiosa em que celebramos o nascimento de Jesus Cristo há mais dois mil anos atrás em Belém da Judéia. Mas, o que representa esta festa e este nascimento?
Uma família pobre fugindo das mesas fartas de injustiça de Israel se encaminha para uma periferia do mundo antigo (Belém), onde poderia encontrar uma gruta segura para um menino (frágil, como qualquer criança pobre) que traria esperança para as gerações futuras, mesmo perseguido pelos poderosos de seu país. Esta criança, filho adotivo de um carpinteiro chamado José, e de uma mulher chamada Maria, não seria um grande empresário, ou intelectual, muito menos um político, mas seria conhecido como filho de Deus.
Que estranho, o filho de Deus ser filho de pobres e ignorantes, ficar escondido numa gruta de uma periferia, e ainda mais, ser perseguido pelos políticos de então! O que poderia uma criança judia fazer pela humanidade? Onde estaria escondido seu poder? Com que armas venceria os exércitos? Com que dinheiro mataria a fome de tantos? Qual a sua nova ideologia? Que rei é esse que nasceu numa manjedoura?
É incrível como pôde o Senhor de todo o Universo, o todo-poderoso, ser tão frágil em seu rústico berço, como ele se assemelhou àqueles que poderia ter condenado fulminantemente por suas faltas e pecados. Como quis ele nascer em meio à miséria, quando poderia ser um menino de uma família abastada, sem ter que fugir, nem se esconder? Mas não, Ele não quis isso!
Que mistério profundo é esse?
Só há uma palavra, que pode fazer com que o mais ignorante de todos compreenda e o mais sábio e crítico se cale, uma palavra simples, mas de significado profundo: Amor!
Não um amor carnal e mesquinho, mas um amor semelhante ao que um pai ou mãe tem pelo seu filho, mas num grau muito mais intenso. Um amor semelhante ao de Abraão, que levou seu filho Isaac a um sacrifício, o qual ele não compreendia a razão. Deus não pediria o sacrifício do filho de Abraão (o qual o próprio Deus impediu), se Ele não fosse capaz de sacrificar o seu próprio filho por nós, apenas por Amor!
Escrito no Natal de 2001

10 de outubro de 2009

A Alquimia musical-literária de Raul Seixas


Raul Seixas, o Raulzito, é daqueles fenômenos raros como o cometa Halley, que só acontecem de tempos em tempos e ainda assim deixam suas marcas de forma duradoura por longo tempo. Raul foi mais do que se costuma pensar, um cantor e compositor brasileiro com letras criativas acrescidas de uma postura e visual extravagante para sua época. Ele foi um grande pensador que conseguiu fazer uma reflexão irreverente sobre nossa identidade nacional e, ao mesmo tempo, conduzir-nos a meditação sobre os grandes problemas que intrigam todo ser humano.
Raul dos Santos Seixas (Bahia, 1945-1989) desde cedo demonstrou ser uma pessoa curiosa e irreverente. Sua paixão pela leitura e pela escrita deu como resultado uma obra musical ímpar que une de forma primorosa uma poesia incrível e ao mesmo tempo uma profundidade filosófica rica de metáforas e alegorias. Entre as grandes influências que podemos perceber na obra de Raul podemos citar: os grandes poetas brasileiros, entre eles o poeta paraibano Augusto dos Anjos, a Filosofia em geral, em especial do filósofo Nietzsche (1844-1900) e do o anarquista francês Joseph Proudhon, o pensador e mago inglês Aleister Crowley (escritor do Liber Oz ou O livro da Lei, Crowley era admirado pelo poeta português Fernando Pessoa, e cognominado a ‘Besta do Apocalipse’), os grandes livros da humanidade, tais como a Bíblia, o Tao Te King, o Alcorão e o Baghavad Gita (do épico hindu Mahabharata). A paixão de Raul Seixas pela literatura e sua vontade de escrever foram obscurecidas pelo seu talento musical, o qual segundo ele era apenas um veículo ou uma desculpa para revelar suas idéias. A obra musical de Raul Seixas pode ser comparada a uma enciclopédia de conhecimentos sobre a vida, onde cada música traz uma ou mais temáticas que dão o que pensar, com temas que vão desde o amor, a morte, a loucura, a utopia de uma nova sociedade, em suma, a cultura de sua época transformada em poesia filosófica.
Raul é o resultado alquímico de tudo que ele assimilou em termos de cultura popular, cultura erudita e contracultura. Ele é um dos baby boomers, ou seja, os bebês nascidos na era da bomba nuclear, aqueles que viveram numa época de transformações profundas nos costumes, na sociedade, na economia, no amor, etc. Ele viveu intensamente as décadas de 50 (época do surgimento do rock n roll, a expressão mais radical da revolução jovem), 60 (época do surgimento da guerra fria e das mudanças tecnológicas, além da revolta contracultural, dos hippies e do maio de 68), 70 (época da guerra do Vietnã, da discoteca, dos punks e do auge da Ditadura Militar no Brasil) e, por fim, da década de 80 (segundo ele mesmo, uma “charrete que perdeu o condutor”), uma década de ilusões perdidas, do fim da Ditadura Militar, da queda do muro de Berlim, do fim das ideologias e das utopias e da URSS.
Diante de tudo isso, podemos compreender que a obra de Raul Seixas tem múltiplas facetas e revela o alcance de suas idéias, que em geral se encontram muito à frente de sua época. Podemos dizer, sem sombra de dúvida, que nenhum outro compositor-cantor brasileiro chegou a tal nível de reflexão, não apenas sobre si mesmo, mas em relação ao seu próprio país e ao ser humano em geral. Sua obra é autenticamente brasileira, mas nem por isso deixa de levantar questões universais.
Que me perdoe o mago e escritor Paulo Coelho, mas Raul Seixas é verdadeiramente nosso mais autêntico alquimista, no qual poucos conseguiram encontrar a pedra filosofal!


O Sertão é um mar
Dedicado a Antonio Conselheiro


O Sertão é um mar
De ossos, destroços
Desgostos, desânimo.

O Sertão é a seca
Encarnada, descarnada
Sem vida, sem água.

O Sertão é a morte
A falta, a ânsia
O calor, a dor.

O Sertão é o inferno
Sem fim, eterno
É a vítima, o algoz.

O Sertão é um mar
O Sertão somos nós.
O diálogo na era do Messenger
Desde tempos imemoriais que o ser humano procura formas diversas de comunicação, iniciando provavelmente pelos gestos, por sons ininteligíveis, sinais, palavras, pelo diálogo, cartas, e-mails e, atualmente, surge o Messenger como uma nova ferramenta da comunicação humana.
É óbvio que o Messenger é uma forma de diálogo, porém com suas peculiaridades e determinado pelas condições e características da sociedade da informação. Como sabemos, o diálogo é a relação comunicativa de duas ou mais pessoas, a palavra diálogo vem do grego ‘diá’, através de, e ‘lógos,’ palavra, isto é o diálogo é interação pela palavra, é distinto do monólogo, a não escuta do outro, por isso o diálogo compõe-se do escutar e do falar, é inter-relação, abertura ao outro. Não é possível diálogo sem essa interação com o diferente. Em relação ao Messenger e partindo do pressuposto que há várias formas de dialogar, nos perguntamos: que tipo de diálogo é ele? Seria o Messenger uma forma de diálogo plenamente transparente? As pessoas envolvidas nessa forma de diálogo percebem as conseqüências do uso da tecnologia nas relações humanas? Compreendem que a distancia promovida pela internet afeta a maneira de se relacionarem? Apesar de estas questões parecerem um tanto estranhas para quem usa tal instrumento, devemos dizer que o uso do Messenger está inserido numa forma de sociabilidade e convivência própria de nossa era, ou seja, vivemos numa sociedade da rapidez da informação, da busca do lucro e do prazer desenfreado, onde as relações tendem a ser superficiais, onde os interesses se movem mais pela satisfação egoísta do que pelo bem comum.
Resumindo, vivemos numa sociedade espetacularizada, individualizada, hedonista e superficial, onde as pessoas estabelecem relações de amizade do tipo acumulativa (exemplo disso são as amizades ‘adicionadas’ pelo Orkut). A maneira de dialogar não escapa a estas condições impostas pela sociedade pós-moderna e nos levam a crer que na ausência do contato face a face, no distanciamento provocado pelo uso da internet, como uma forma de máscara, onde as pessoas dizem aquilo que não diriam num diálogo face a face, olhando nos olhos do interlocutor, por isso este recurso pode levar as pessoas a fingirem algo que não são. É uma espécie de lugar mágico, onde se pode dizer na intimidade da internet todos os segredos que não podem ser revelados a luz do dia. O Messenger permite dar asas a imaginação, mas também pode se tornar um refúgio onde as pessoas podem revelar suas piores perversões sociais. Prova disso é o espaço que ele ocupa nos encontros virtuais de pedófilos com crianças, de psicopatas com suas vitimas, de indivíduos mal intencionados com suas presas inocentes.
Pena que o uso de tais recursos geralmente suplanta o encontro das pessoas no face a face, na transparência do diálogo, onde nada pode ser completamente fingido, pois podemos perceber no olhar do outro suas expressões. É claro que o Messenger não opera apenas como instrumento do mal, ele tem sua importância, a qual poderia ser promovida através da sinceridade, do diálogo franco, sem mascaras e subterfúgios, onde somos nós mesmos.
A Amizade em tempos de Orkut

A amizade é um dos maiores bens que o ser humano pode possuir. Ela é uma forma de amor não sexual que faz com que as pessoas aproximem-se umas das outras de forma a partilharem diversos bens. Podemos dizer que uma vida sem a companhia de amigos não é digna de ser vivida, pois os amigos são aqueles que compartilham conosco tanto as alegrias quanto as tristezas da vida. Não é a toa que até para fazer o mal os homens buscam a companhia de comparsa que na verdade pé uma espécie de amigo, muito embora seja repulsivo a nós pensar em amigos fazendo o mal. Diz o ditado que é melhor ter amigo na praça do que ter dinheiro no banco, mas será que isso continua sendo verdade no mundo ultra-capitalista em que vivemos?
Os gregos e os romanos, por exemplo, prezavam muito este sentimento a ponto de se tornar um verdadeiro problema filosófico como podemos conferir nas obras Lísis, um diálogo de Platão, e Ética a Nicômaco, de Aristóteles, onde há um capitulo inteiro dedicado a essa questão, também podemos citar Epicuro, celebre por sua comunidade de amigos, bem como os romanos Cícero e Sêneca que também escreveram sobre o assunto. Segundo Aristóteles, a amizade é a existência de uma alma em dois corpos. Em grego a amizade se chamava philia, este termo deu origem a vários outras, tais como, filantropia, filosofia, etc. Mas afinal de contas o que é ser amigo? Existem vários tipos de amizade ou apenas um só? Como devemos pensar a amizade no mundo pós-moderno? Como se compreende a amizade na era da informática? Qual o papel do Orkut na constituição da amizade hoje?
As amizades no mundo de hoje tendem a ser em geral superficiais devido a rapidez e a dinâmica do mundo de atual, com suas megalópoles e metrópoles, nas quais as pessoas vivem num ritmo frenético e apressado. Como encontrar tempo para fazer amigos? E mais ainda, para conhecê-los, cultivar as amizades e distinguir os verdadeiros dos falsos amigos? Como dizem os chineses, os amigos não são feitos, mas descobertos. Seria possível pensar desta forma hoje? Será que nós conseguimos descobrir os verdadeiros amigos nesse emaranhado de pessoas a nossa volta? Existe atualmente um novo tipo de serviço, composto pelos chamados personal friends, amigos contratados para servirem de companheiros, para pessoas que não tem tempo de fazer amigos (executivos e pessoas que vivem mudando de cidade), mas precisam de um ombro amigo para chorar suas magoas e compartilhar alegrias.
Diante de tantas questões surge a internet com suas seduções e facilidades, uma delas é o chamado Orkut. O Orkut é uma forma de virtualizar as amizades, levando a amizade para o mundo digital, são as chamadas redes de relacionamento. O Orkut foi criado em 2004 pelo engenheiro turco da Google, Orkut Büyükkokten. Atualmente é a rede social mais popular no Brasil, com 23 milhões de membros (51 % dos usuários do Orkut é brasileira). Nele as pessoas encontram velhos amigos, descobrem novos, partilham interesses, criam grupos e dividem idéias. Mas, podemos nos perguntar, até que ponto as pessoas que estão nessa rede de amigos virtuais são verdadeiros amigos? Por que substituir as amizades nascidas do convívio real por amigos virtuais, muitos dos quais não passam mesmo de amigos virtuais? E os chamados fakes aqueles que criam perfis falsos e se fazem passar outras pessoas para enganá-las?

Publicado em O Povo, Jornal do Leitor