Espaço reservado para publicação de reflexões pessoais sobre os mais variados assuntos
7 de julho de 2013
29 de junho de 2013
Raul Seixas e 'Os Números'
“Os números governam o mundo”. Esta frase
sintetiza de modo admirável uma forma de saber que tem sido tão esquecida no
mundo atual. No mundo antigo o filosofo grego Pitágoras (séc.VI a.C.) criou uma
escola em que os números eram vistos como a ‘arkhe’ (o principio) da realidade, ‘tudo é numero’ diziam os pitagóricos.
O
cantor-compositor Raul Seixas escreveu a musica ‘os números’ para mostrar como
os números estão presentes no nosso dia a dia, mas não são os números da
economia ou da matemática financeira, o que ele queria revelar era uma forma de
matemática mais importante, a matemática simbólica, não de quantidades, mas do
aspecto qualitativo dos números. Essa forma de matemática simbólica muitas
vezes é vulgarizada com o nome de numerologia. ‘Os números’ talvez seja uma das
musicas mais simples e enigmática do Raulzito, pois na sua simplicidade
aparente ela nos leva a uma reflexão filosófica do aspecto numérico da
realidade.
A
musica é um baião no bom estilo nordestino, ritmo contagiante que não deixa
ninguém parado, numa cadencia irresistível. Nela Raulzito segue uma sequencia
de números que parece aleatória, mesmo partindo do numero 1 (um), segue o 2
(dois), o 4 (quatro), o 7 (sete) e o 12 (doze). Nestes números simbólicos se
descobre um mundo de relações que não são apenas de quantidade, mas de
qualidade. Os antigos hebreus tinham um respeito profundo pelos números e os
consideravam os arquétipos (modelos) da realidade, para isso criaram um método
de interpretação dos números, a guematria, que faz parte da kaballah (tradição
oral), nela cada numero tem seu significado, o qual pode ser comparado as
idéias pitagoricas.
Na
musica podemos fazer algumas relações, por exemplo, o numero 1 é a unidade, o
principio de todas as coisas, a origem de tudo, Deus, o 2 é a separação, a
divisão, o mal(?), e tudo que faz a diferença e que se opõe, o 4 é o
equilíbrio, o ponto fixo, o que abrange todos os elementos, os pontos cardeais,
o sete é a plenitude, o descanso, a realização e o ápice, e finalmente o 12,
que tem significado especial para os hebreus, as doze tribos de Israel, os doze
apóstolos, as doze estrelas do apocalipse e representa a multiplicação do 3
pelo 4. Enfim, nestes cinco números se revela o segredo universal, religioso e
profundamente místico em que Raul Seixas quis mostrar de uma forma simples o
que há por trás das aparências e das coincidências, ele que com doze anos já
desconfiava da verdade absoluta.
16 de abril de 2013
Torcidas ‘organizadas’ x Estado desorganizado
O
que estamos vendo nesses últimos meses é digno de nota, no que diz respeito à
questão do futebol brasileiro. Já não bastasse os cartolas, os conchavos e a
multimilionária industria do futebol nacional e internacional, bem como a copa
que se aproxima, agora um novo tópico relacionado a isso vem a tona, a
violência das torcidas ‘organizadas’.
Dizer
que os torcedores são vândalos ou bandidos travestidos de torcedores, não
resolve o problema e, na verdade, põe pra debaixo do tapete a verdadeira
questão. Quem são esses novos gladiadores que não estão mais no interior do
coliseu (arena de luta), mas do lado de fora? Qual a razão de sua revolta? O
que escondem tanta ânsia de violência?
As
chamadas torcidas organizadas (grosso modo) são agremiações que tem como meta a
organização dos torcedores e a articulação interna de seus interesses, mas o
que estamos vendo é a transformação desta instituição em uma verdadeira caixa
de ressonância de outros problemas sociais que só então passam a ter
relevância, uma vez que ferem os interesses da grande indústria do futebol e da
copa. O que estamos presenciando todo dia não é apenas a invasão de vândalos no
interior das torcidas organizadas, como se apregoa nas mídias, mas o reflexo da
fragilidade de nossa sociedade e do Estado, de dar conta de conflitos internos
que surgem em diversos âmbitos, seja na segurança publica, no transporte, e inclusive
no esporte.
As
formas de controle usadas pelo Estado se mostram ineficientes para diminuir o
impacto de sua fúria. A insatisfação de toda uma sociedade se manifesta não
apenas em passeatas e greves, mesmo nesse encontro entre torcidas rivais vemos
a violência na sua forma mais confusa, pois como entender que aqueles que vão a
uma partida de futebol precisem se digladiar ao fim do jogo? Antes de tudo
deve-se ter em mente que o esporte é nada mais que uma virtualização da
violência, a velha historia do ‘jogo limpo’ (‘fair play’) é uma maneira
indireta de dizer que o esporte promove violência, por isso se exige o tal
‘jogo limpo’, os times ou seleções encarnam todas as expectativas de uma
guerra, aqui as nações são representadas pela seleção que vai ao campo de
guerra derrotar o ‘inimigo’. As torcidas se tornaram o espaço onde essa ‘guerra
virtual’ se realiza efetivamente, embora o esporte precise seguir as regras.
Todo o contingente de frustração social, ódio pelo diferente e pelo outro,
encontra agora uma nova válvula de escape, as brigas entre torcidas rivais, não
é apenas o que aparece imediatamente aos olhos, mas todo o conjunto de fatores
não evidentes, mesmo que inconscientes.
Esperar
que uma copa do mundo ou uma partida de futebol seja o espaço de ‘paz e amor’,
de pura inocência esportiva é não entender bem a regra do jogo. O que acontece
nos estádios e fora dele é reflexo de toda nossa sociedade, um dado que devia
ser levado em conta antes de apenas reprimido. Nosso vandalismo de cada dia é
escondido da grande massa de expectadores, mas não é menos letal, porque sutil.
27 de janeiro de 2013
As Igrejas da Prosperidade
A Teologia da
Prosperidade é o nome dado a um movimento neopentecostal que tem como meta
principal colocar a prosperidade como meta do cristão e resultado das bençãos
dadas por Deus como sinal de uma aliança com ele. Os grandes exemplos de
igrejas seguidoras desta forma de teologia são a Igreja Universal do Reino de
Deus, a Igreja Internacional da Graça de Deus, a Igreja Mundial do Poder de
Deus, Renascer em Cristo, entre outras.
Esta linha de
pensamento teológico é aparentemente recente, teria surgido com o
neopentecostalismo (fins do século XX), mas finca suas raízes nas origens do
protestantismo, em especial com Lutero e Calvino (Séc.XVI). Com Lutero há uma
ruptura não apenas em relação a doutrina e liturgia católica, mas também em
relação a concepção de trabalho, que na Idade Media era visto como sacrificio e
castigo (a origem da palavra trabalho em latim é tripalium, nome de um
intrumento de tortura), passando agora a ser interpretado como 'vocação' (Beruf,
em alemão tanto significa trabalho como vocação), ou seja, em seu trabalho, em
sua profissão, o homem é chamado por Deus para contribuir com seu Reino, uma
especie de releitura da parábola dos talentos. João Calvino por sua vez,
destaca em sua obra Institutas, a questão da predestinação, ou seja,
Deus teria escolhido de antemão aqueles que serão salvos e os que se danarão no
fogo eterno, para os burgueses calvinistas, a prosperidade financeira é o sinal
da eleição divina que cumula seus seguidores de bens materiais. Max Weber
(sociólogo alemão, séc.XIX-XX), em sua obra A Ética protestante e o
espirito do capitalismo, desvenda de forma clara como a concepção
protestante de trabalho unida ao ascetismo e a parcimonia dos fieis burgueses
levou necessariamente ao desenvolvimento do sistema capitalista na Europa e na
América, esta ultima como grande reduto dos puritanos ingleses que tem na
economia e no empreededorismo uma marca, exemplo disso foi o inventor americano
Benjamin Franklin que criou a frase "tempo é dinheiro".
As igrejas
que hoje seguem esta linha de pensamento funcionam como agências que levam os
fieis ao empreedimento e a busca de riqueza, como forma de demonstrar que são
agraciados por Deus, muitas vezes como um desafio, onde Deus é representado
como 'o dono de todo ouro e prata' e que pela sua propria palavra sagrada seria
o responsável em atender as demandas financeiras de seus fieis. A fé e o
sacrificio pecuniario tornam-se a moeda corrente que obriga Deus a distribuir
bens como recompensa. As grandes campanhas realizadas por estas igrejas tem
como foco principal a garantia de resultado, de sucesso, de prosperidade, onde
os bens materias tem a prioridade. Muitas vezes argumenta-se que o fiel como
filho de Deus é indigno de viver na miséria, mas ao invés de apresentar as
reais causas da miséria, isto é, a acumulação de riqueza e a má distribuição de
renda, coloca como causa desta miséria algo sobrenatural, como possessão
demoníaca, maldição familiar e até mesmo, a falta de fé (?). Esta prática é
perniciosa por transformar a riqueza no sumo bem do cristão, sendo contrária
mesmo ao Evangelho que diz "não levem bolsa nem alforge" (Lc 9,3), ou
"o amor do dinheiro é a causa dos males" (1 Tim 6,10), ou ainda
"não se pode servir a dois senhores, a Deus ou ao dinheiro (Mamom)", ou
finalmente o conselho de Jesus ao jovem rico "se queres ser perfeito, vai
vende teus bens e dá aos pobres, depois segue-me" (Lc 18,18-23). Tal
teologia da prosperidade não admite que o cristão possa sofrer ou ser pobre,
ser pobre é interpretado como uma maldição, ou seja, o contrário do que diz o
Cristo que "o reino de Deus pertence aos pobres", o proprio Cristo
foi ironicamente vendido por trinta moedas de prata (Mt 26,15).
É óbvio que
esta linha de pensamento se coaduna perfeitamente não só para a sociedade
tardo-capitalista em que vivemos, mas também se enquadra ao tipo de fiel que
esta sociedade criou, o fiel egocêntrico, hedonista, individualista,
imediatista, que vê a igreja como clube social ou shopping da fé, onde se paga
para assistir um show ou espetáculo de curas e milagres. Este fiel não tem
ilusões em relação a transformar a sociedade, na verdade sua ideologia é a de
que deve-se 'converter' outros ao mercado da fé, pois só assim os males da
miséria e da pobreza acabarão. Para ele, todos tem o direito de ser felizes e
ricos, mas apenas os verdadeiros fieis é que se enquadram nesta categoria.
O dízimo, ao
invés de ser uma forma de suprir as necessidades da comunidade, isto é, uma
forma de redistribuição social da riqueza, torna-se um instrumento de lucro
torpe (1 Tim 6,5). No mercado da fé há espaço para diversas igrejas,
principalmente para aquelas que sabem usar o marketing e a mídia, transformando
pessoas infelizes e depressivas em verdadeiros consumidores para a glória do
capital!
16 de janeiro de 2013
Jonas, um profeta relutante
Profeta (em hebraico, nabi) é aquele que
anuncia e proclama
a Palavra e a Vontade de Deus; em Israel Moisés é
considerado o grande profeta e modelo de todos, mas ele mesmo aponta para um
profeta maior, Jesus Cristo, o novo Moisés. Na Bíblia (Antigo Testamento) são citados grandes profetas além de Moisés, tais como Elias,
Eliseu, Natan, além dos profetas chamados maiores, e os doze profetas menores.
A função dos profetas é denunciar a injustiça e apontar os caminhos do direito
e da justiça como vontade de Deus.
Jonas, filho de Amati (Jn 1, 1), é um dos doze
profetas menores, a obra que tem seu nome por titulo é importante e singular
entre os demais profetas, e até Jesus a cita (Mt 12,38-42; Mc 8,11-12;
Lc 11, 29-32) ao se referir ao sinal de Jonas, que ficou 03 dias na barriga de
um peixe, usando-a como metáfora da sua ressurreição. O livro de Jonas foi
escrito no final do período
persa (por volta de 538-333 a.C.), não é um livro
histórico, mas uma novela com conteúdo sapiencial, pois ele não pretende falar sobre algo que aconteceu, mas dar um
ensinamento sobre a universalidade da salvação de Javé, em oposição à visão exclusivista e nacionalista judaica do período pós-exílio, a
qual não aceitava que os povos estrangeiros pudessem ser salvos e perdoados por
Javé, pois considerava que apenas o povo de Israel era o povo eleito, temos
como paradigma disso os escritos de Esdras (398 a.C) e Neemias (450-350 a.C).
Jonas é enviado por Javé para pregar o
arrependimento e a conversão na grande cidade de Nínive. Nínive é a capital da
Assíria, grande império que predominou no século VIII a.C. e que representava
para os judeus o paganismo, a violência e a injustiça. Jonas deve ir à grande cidade e proclamar o arrependimento aos
ninivitas, que prontamente se convertem, o próprio rei proclama um decreto de
conversão. Jonas, porém, revolta-se porque Javé desiste de destruir a cidade,
numa atitude individualista e autoritária. Este é o grande desafio da Igreja hoje,
ir às grandes cidades, aos centros urbanos, as metrópoles, a mensagem do
Evangelho deve ser proclamada nos grandes espaços, nas cidades, metrópoles,
praças, meios de comunicação. Quantas dificuldades nos aguardam, mas ao mesmo
tempo, quantas esperanças enchem o nosso coração de entusiasmo! Vivemos em
cidades grandes, cheias de problemas, mal administradas, sujas, poluídas,
doentes, onde impera a violência, as drogas, o descaso pela vida, onde há
muitas tentações, muitos falsos caminhos que iludem as pessoas.
É
para estas grandes cidades, das quais queremos muitas vezes fugir, como o
profeta Jonas, que Deus nos envia para convidar a conversão e proclamar o perdão
dos pecados e a salvação.
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